Li fazem poucos meses e preciso recomendar a leitura, é fantástico. Recomendo principalmente para os educadores como forma de reflexão sobre insistir com os alunos. A resenha que segue não foi escrita por mim, pertence a Fábio Dutra e está publicada em sua página no
Skoob. Gostei tanto que resolvi publica-la.
I will just say goodbye.
"Não é incrível como uma
coisa simples pode mudar a nossa vida? Um milagre é isso. Não luzes
piscando, corais de anjos e pessoas ressuscitando. Pode acontecer a
qualquer hora e ninguém saber, a não ser a pessoa que estava vivendo
aquilo. Comigo foi assim."
Adolescência no meio britânico, repleto de bullying e retaliação de todo
e qualquer gesto de liberdade de mente ou de espírito. A primeira
impressão que eu tive foi a de estar observando a vida de pessoas que
entram em problemas por livre e espontânea vontade. Bom, ai que Burgess
se coloca e mostra o que há por trás de cada 'baderneiro'.
Billie, Rob e Chris estudam na mesma escola, mas sempre estão na
iminência de suspensões, detenções e transferências pra 'WASP' ou para o
reformatório de fato: temido e odiado. Mas isso não é de graça, cada um
prioriza o estado caótico de suas situações dentro de casa, não
sobrando tempo para priorizar o que na idade deles deveria ser um foco
maior - a escola. Digo, no caso de Billie, se você tem que cuidar da sua
mãe enterrada no alcoolismo, com uma irmã mais nova prestes a se tornar
a segunda empregada da casa sem poder protestar - ao mesmo tempo em que
sua fama de briguenta na escola te obriga a manter uma reputação para
tal, aí que a barra sempre pesa, e quase ninguém quer te ajudar a
levantar e mesmo qualquer ajuda é suspeita. Ao lado de Billie, temos
Rob, maltratado pelo padrasto que por consequência maltrata sua mãe, com
um irmãozinho meio pentelho, mas que depende e se espelha de certa
forma nele, adicione-se aí o bullying hardcore na escola, temos o
resultado da equação: não há auto-estima que te faça resistir sozinho. E
pra fechar tem o Chris, que tem seus princípios tão atrelados, tão
honestos se colocado na perspectiva dele, e um coração de diamante,
porém tem um pai com níveis bombásticos de stress e agressividade
reprimida.
"Arranquei a blusa e fiquei lá parado com a minha camiseta do Metallica,
orgulhosamente filho da puta, viadinho, drogado e satanista. Estava
toda rasgada e imunda, e eu estava todo suado e vermelho, com lágrimas
nos olhos - na verdade chorando como um bebezinho."
Desde que soube da existência desse livro, a estória passada num Reino
Unido suburbano e afins, sabia que não era apenas um YA qualquer, e já
antes de ler o tracei no mesmo paralelo de 'As Vantagens de Ser
Invisível", são caminhos e países diferentes, mas o ponto central está
lá - outsides, renegados, excluídos e sem grandes esperanças -
literatura trazendo pra sociedade quadrada e perfeita, os podres sempre
jogados pra debaixo do tapete, ou largados na pá lá no quintal. Poucas
coisas são capazes de fazer com que essas pessoas voltem a crer que são
dignas: música, uma boa amizade, livros, é aquele pontinho de fé de quem
viu o mesmo que você e botou pra fora, que acaba te encorajando á uma
libertação de mente e otimismo.
"Dá pra imaginar? Você ser transformado na coisa que mais odeia no
mundo? É isso o que os monstros fazem com a gente. A pessoa não é
devorada por ele - ela se transforma num deles."
Há no livro essa batalha também do não se tornar o exemplar do século
XXI do que seus pais e afins se transformaram há duas décadas. Toda e
qualquer pessoa passa - consciente ou inconscientemente - por anos de
batalha definindo seu lugar no mundo e se separando das influências
máximas dos pais, aliás se tornar algo parecido com eles, na maioria das
vezes, não é e nunca será opção. Viver sobre um opressor e passar a ser
um é a declarada falência, jogar no lixo a própria alma por enveredar
pela estrada mais curta e confortável. Há que se trabalhar nisso.
"Na verdade nem eu, só sabia que estava fazendo aquilo pelo Rob, pelo
Frankie, pela Billie e por mim também, e por todo mundo que é obrigado a
passar anos e anos fazendo coisas que detesta, e isso tudo só porque
ninguém tem o bom senso de deixar as pessoas fazerem o que acharem
melhor pra elas mesmas."
Partindo pra reclamaçõezinhas: o final ficou em aberto demais pra mim,
não considero uma falha, se for será minha por querer detalhes demais.
De qualquer forma, é mais um livro pra sentir, pra empatizar e propagar
de coração aberto e de forma simples, porém não menos valiosa, assim
como foi escrito.